10 de julho de 2010

Meus textos - O narrador e a vida moderna aplicada à escola

      No ensaio intitulado O narrador, Walter Benjamin discute sobre a questão da narrativa e das experiências que são registradas ali, as narrativas são uma forma de registro da memória. Já em 1936, Benjamin previa que o advento da modernidade resultaria numa morte da narrativa, a sociedade baseada numa experiência coletiva estava em declínio, assim, o papel do narrador encontrava o seu fim na sociedade moderna.
      Hoje, 74 anos após, o texto do pensador alemão ainda suscita discussões e tais discussões, podem ser pensadas a partir de uma avaliação da educação nos tempos atuais. Há espaço para a narrativa no mundo contemporâneo, a narrativa ainda sobrevive de alguma forma?
      Benjamin, em seu texto, fala de “Erfahrung”, e esse termo alemão significa a experiência. Erfahrung não uma experiência qualquer, mas uma experiência que é fruto da tradição, formada como uma espécie de longa viagem e que leva tempo para ser sedimentada. Podemos dizer que é a experiência coletiva e se essa experiência sofre rupturas, se há redução nessa formação da tradição, então, a experiência dá lugar à vivência. Essa vivência é dada pelo termo “Erlebnis”, que representa a vivência individual, ou seja, a tradição ou a experiência coletiva sofre um empobrecimento.
      Essa transição da experiência para a vivência é uma transição do caráter coletivo para a personalidade. Em suma, a experiência que era pública tornou-se uma experiência que é particular. A modernidade deu espaço para a sociedade de produção de massa, as narrativas vão sendo tediosamente reproduzidas e assim, as informações não são mais pensadas.
      As informações não pensadas são um problema no âmbito escolar, ao que parece a escola não achou espaço significativo no mundo moderno. Os alunos parecem não entender o real papel da escola, não conseguem atentar para o conhecimento dos seus professores, e ao mesmo tempo, a escola parece estar alheia a essa ruptura que ocorreu. A narrativa, tal qual como concebida por Benjamin, isto é, como uma arte ou dom de se contar histórias perdeu o seu sentido hoje.
      As experiências passadas não são retidas pelos alunos de hoje, pois a educação também foi massificada. Antigamente, a escola era vista como formadora de seres pensantes, formava “homens”, formava cidadãos que conheciam e respeitavam as experiências dos mais velhos. Os alunos aprendiam com a História e com as histórias, eles a compreendiam, retiam e as narravam para os mais novos. Hoje a educação, ou melhor, o sistema educacional não se preocupa em formar pensadores, o sistema está preocupado com números. O conhecimento não é mais transmitido, mas sim, superficialmente repassado. O sistema apostilado é um claro exemplo disso, pois as informações são multifacetadas, “picadas” e não há aprofundamento algum no conteúdo das disciplinas. As informações passadas por esse sistema de ensino não permitem que os alunos façam correlações, e assim eles não podem pensar sobre o que esta sendo ensinado.
      A massificação da educação prejudicada a escola à medida que tira dos professores o papel e o poder da narrativa e tira dos alunos a capacidade de serem ouvintes dessas narrativas. Desta forma, a escola perde o seu sentido tanto para quem ensina quanto para quem é ensinado. E o local que deveria ser uma sede de transmissão do conhecimento dá lugar ao vazio, ao declínio do aprendizado. Esse declínio resulta em professores desestimulados, desiludidos com a atividade docente e em alunos desinteressados, indisciplinados e sem perspectivas de futuro.
      No entanto, todo o declínio ou todo fim dá lugar e espaço para o surgimento de uma nova era. A narrativa, tal como Benjamin a conheceu certamente morreu. No entanto, não devemos pensar a modernidade como um mal e sim como um espaço em que novas narrativas devem surgir. A sociedade contemporânea deve buscar uma nova forma de narrar, o narrador moderno talvez não esteja baseado no registro da memória, mas no registro de outros acontecimentos que nos cercam. A arte de narrar histórias, narrar experiências é uma arte que pode ser continuada, desde que encontremos uma formar de reinventá-la, devemos reciclar a narrativa.


BENJAMIN, W. O Narrador. In: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1980.

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